Coincide normalmente com aquela fase em que passamos a ter de ser nós próprios a decidir a nossa vida, a fazer as nossas escolhas, a ter de optar entre o preto e o branco sem ter a certeza do que o preto ou o branco nos podem trazer.
E para além disso, tudo à nossa volta parece não bater certo. Os nossos pais parecem não nos compreender: dá ideia que vivem num mundo que não é o nosso, que nunca iriam entender os nossos problemas e mesmo que entendessem não iam poder ajudar.
O nossos amigos não estão tão presentes como gostariamos. Vão fazendo a vida deles, tem o seu trabalho, as suas namoradas/os, não tem tempo para ouvir os nossos dilemas e, mesmo que tivessem, não iam poder ajudar.
A nossa namorada/do preocupa-se mais com insignificancias do que em realmente nos perceber. Não percebe que me chateio com ela/ele não porque não gosto dela/dele mas sim porque nada parece bater certo no geral. Porque não me sinto bem comigo mesmo/mesma, porque existem tantas coisas que eu imaginaria que seriam diferentes, porque é tudo tão mais complexo, porque não estou bem aqui, nem ali, nem em lado nenhum.
Há uns anos atrás pensariamos que por esta altura já teriamos um emprego que nos completasse, que fosse estável e onde ganhássemos o suficiente para fazer a nossa vidinha (viagens, jantares, saídas, presentes, caprichos, ...). Viveriamos rodeados de amigos sempre bem dispostos, com todo o tempo do mundo para nós. Viveriamos em harmonia com os nossos pais porque afinal já eramos crescidos. Já teriamos encontrado a mulher/homem dos nossos sonhos. E tudo em nosso redor, tirando uma outra chaticezita, iria torcer a nosso favor.
Mas o que é certo é que, mesmo que tivessemos tudo isto e mais alguma coisa chega uma altura em que nos sentimos insatisfeitos, em que tudo parece estar errado, em que pura e simplesmente queremos mais!
Chegada esta fase (sim porque ela bate a porta de todos nós), é que realmente nos definimos como acomodados ou como lutadores. e isso faz toda a diferença... Passo a explicar: ou nos entregamos à auto-vitimização, ou encaramos os problemas e damos a volta por cima.
Opção 1: a auto-vitimização. À partida parece ser a reacção mais evidente, uma vez que, na realidade, o mundo parece estar contra nós. Chamamos a atenção das pessoas, parece que nos sentimos um pouco mais acompanhados, libertamos todas as nossas frustrações através das lágrimas e temos todo o espaço para espernear e berrar tudo o que bem nos apetecer.
Opção 2: encarar o problema (ou a quantidade anormal de problemas que de repente surgiram todos ao mesmo tempo na nossa vida que parecia ir tão bem). É duro porque temos de ter a capacidade de conviver connosco próprios. Temos lidar com as contradições da cabeça e do coração.
É preciso coragem e muita força para perceber que estamos perto de nos entregar à auto-vitimização mas que somos capazes de lutar por nós, de perceber que tudo não passa de uma fase (semelhante à de outras pessoas que já passaram pelo mesmo e que nós nem nos apercebemos). Acima de tudo ter a noção que tudo isso faz parte de uma aprendizagem que só nos fortalece, nos faz melhores pessoas, nos enriquece, e nos faz crescer. Porque a vida tem destas coisas...
Curiosamente, enquanto estava embrenhada nestas linhas recebi um poema de Pessoa que em muito serve de conclusão a tudo o que aqui tentei dizer.
"Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes, mas não esqueço de que minha vida é a maior empresa do mundo, e que posso evitar que ela vá a falência.
Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver, apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.
Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e se tornar um autor da própria história.
É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar um oásis no recôndito da sua alma.
É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.
Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.
É saber falar de si mesmo.
É ter coragem para ouvir um "não".
É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.
Guardo todas, um dia vou construir um castelo..."
P.S. - Embora a leitura já tenha sido muita, aconselho a leitura do post "The Twenty Something..."